segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

NILO PEREIRA - VINTE ANOS NA ETERNIDADE - POR ROBERTO PEREIRA (SEU FILHO).

ROBERTO PEREIRA (*)
NILO PEREIRA
NILO PEREIRA - VINTE ANOS NA ETERNIDADE
Roberto Pereira (*)


Saudade, à Guimarães Rosas, é ser, depois de ter. Para a família do escritor Nilo Pereira, que o teve como marido, pai e avô, ele hoje é somente saudade. A ausência-presença de um homem que nunca se exauriu no amor aos seus entes queridos.
Um Nilo oceânico, como foi chamado por muitos dos intelectuais após o seu encantamento. Sim, ele era inesgotável, por exemplo, no seu saber acadêmico, na sua inteligência apurada, na sua inarredável moral. Religioso, tinha Fé inabalável em Deus, nosso Pai celestial.
Ocupou vários cargos públicos, tendo sido por diversas vezes secretário de Estado, deputado, e, em dois mandatos, diretor da Faculdade de Filosofia de Pernambuco. Em todos estes lugares, demonstrou competência apurada e ilibada conduta. Sempre se dizia fiel à missão do bem social, servindo às causas sem delas se servir, sendo este o seu postulado de conduta.
Deixou, portanto, um legado incomensurável de talento e cultura, de arte e inteligência, de honradez, ética e moral, infatigável no empenho e no desempenho dos seus deveres de um ser humano que sabia ser humano. Era, assim, um homem de bem e do bem, sendo esta a herança deixada à sua prole, porque riqueza material não era o seu forte.
Chegava a dizer: “o dinheiro foge de mim”. Quando recebeu, por seu conjunto de obras, da Academia Brasileira de Letras, o Prêmio Machado de Assis, honraria que coube à minha pessoa, por escolha dele, representá-lo na Casa de Machado de Assis, sentiu-se realizado por ter feito jus a tão alta distinção.
Naquela Corte Literária, a maior do Brasil, diversos dos imortais me procuraram para que ele aceitasse postular uma vaga existente no momento. À época, o grande Barbosa Lima Sobrinho enviou, por meu intermédio, o comunicado de que, se ele aquiescesse, Barbosa, que nunca havia indicado nenhum dos imortais, no caso de Nilo sairia, à condição de porta-voz, ou cabo eleitoral para usar o jargão político, cumprindo a formalidade do peditório do voto. Pediria por Nilo e o faria, a Pe. Vieira, com argumentos.
Ao retornar, contei ao meu querido pai que, rápido, retrucou: "diga que, agradecido, repito Camões: “melhor merecer e não receber do que receber sem merecer”. Eu, meu filho, não me acho à altura daquela Instituição de tantos valores intelectuais". Esta uma humildade que também muito lhe caracterizou enquanto vivente deste planeta.
Mas o prêmio era somente a honraria, o que muito consagrava a quem o recebia. Todavia, no ano seguinte, a ABL, além do laurel, passou a conferir um recurso em dinheiro, então estabelecido em 50 mil reais. Informei a meu pai, dizendo-lhe: está vendo, agora, além do verbo que consagra o espírito, existe a verba que alimenta o corpo. Ele, de pronto, comentou: “eu não digo que o dinheiro foge de mim, mas não faz mal, se não veio, foi porque não tinha que ser meu. O dinheiro, Roberto, é o azinhavre da alma”. Esta uma frase dele bastante contundente, mas que tinha o alvo do combate a todo o ganho que não fosse rigorosamente legítimo. No caso, a compensação financeira era verdadeiramente justa, razoável e salutar. O que ele não aceitou foi pedir uma retroação, porque não se sentiria bem em praticar filigranas para auferir ganhos pessoais.
Este o seu padrão de conduta, a verdade que ele tomava como operária da Fé, o caráter emoldurado por ideias e ideais, todos da fidelidade do seu comportamento, da sua dignidade, uma moral irrefutável, inquebrantável.
Era um homem telúrico, sempre saudoso da terra onde nasceu, o seu Ceará-Mirim, que, segundo o escritor e imortal Josué Montello, era a sua pátria espiritual. A escritora Lúcia Helena Pereira, sua prima, também poeta, fiel à memória de Nilo, sempre deu realce às lembranças de Nilo à sua infância, à cidade onde nasceu. Este menino se fez homem, um adulto que da meninice não se desfez. Esta a simbiose de um Nilo maduro, mas conservando o frescor dos verdes anos, uma das suas inspirações.
Teve na vida duas grandes vocações: a do jornalismo e a do magistério, em que ele mais se realizou, sem esquecer que a sua produção intelectual, no plano da ensaística e da literatura, era uma decorrência destes dois pilares de sua natural aptidão.
Mas, hoje, decorridos vinte anos do seu desenlace desta vida, entre os seus familiares, o que muito nos marcou foi a pessoa humana, o líder de um núcleo amoroso, unido em torno dele, essa Igreja espiritual a que se reportava o Papa João Paulo II. E o melhor entre os seus filhos: somos tristeza que chora as lágrimas do coração, mas somos também alegria porque por onde chegamos o nome de Nilo é cultuado, admirado, respeitado até pelos que divergiam de suas ideias e até da sua crença em Deus. O amor à esposa, Lila, somente compartilhado com os seus filhos. Este o Nilo na sua inteireza, íntegro e integral, gente e agente do bem.
Ter sido seu filho foi uma dádiva divina. Ser tristeza e ser alegria somente pode aplanar a dor tão doída da perda de quem, tendo ido, permaneceu, porque o seu legado, junto à família, foi de amor e de paz.
Papai, você viverá enquanto vivermos, porque seus filhos também nunca se esgotaram da condição de filhos e de admiradores fervorosos.
Somos saudade, somente saudade! Uma doce saudade amarga!

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(*) Filho de Nilo Pereira - Secretário Executivo da Comissão de Turismo Integral do Nordeste - CTI - tendo chegado logo cedo, em Recife/Pe, vindo de Lisboa/Portugal, em viagem de trabalho

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