segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

NILO PEREIRA - O SONHADOR DO VALE, POR SEVERINO VICENTE.

NILO PEREIRA
Nilo Pereira: o sonhador do vale
Severino Vicente


É bom sonhar, o homem que não sonha não vive, existe. Existir não é necessário, necessário é viver, criar e sonhar, os sonhos das possibilidades, do vir a ser. O chão é o lugar do homem, quando entendido e amado, é sagrado. Muito mais quando há o encontro mágico entre o criador e criatura, motivado pela inteligência emocional, quando somos capazes de compreendermos em determinado momento da vida a hora do agradecimento, da volta e do reencontro. É uma atitude dos grandes e Marcel Proust no ensinou a entender esse mistério, esta rápida passagem do menino e do homem, caminhando para o ocaso da vida.
Este momento proustiano Nilo Pereira absolveu muito bem, incorporando-o no seu verde vale. Uma cidade nascida às margens do rio Ceará Mirim, conhecido no passado como Rio Pequeno, habitado pelos índios Potiguares, que recepcionaram franceses, espanhóis e portugueses, numa afável convivência, quando desenvolveram uma espécie de comércio clandestino, cedendo aos estrangeiros o pau-brasil, existente em grande quantidade na região, e recebendo especiarias e quinquilharias, transportadas pelo leito do rio Guamoré.
Dom Henrique Felipe Camarão era o chefe da tribo, aliando-se aos portugueses fincou os alicerces do primitivo povoamento. Erguendo um convento, uma igreja e um prédio para instalar uma Câmara.
Este simples relato histórico para mostrar os primórdios desse belo vale, que para Nilo era comparado como uma primeira manhã da criação, a puríssima, nascitura, ainda bafejada pelo hálito de Deus.
O Poeta Sanderson Negreiros, genial e preciso, fazendo um comentário do autor de "Imagens do Ceará Mirim", uma espécie de poema-história que dedicou à sua terra assim conclui: "Nilo Pereira retorna à planície mortal e comum onde o sol veleja em hábil azul (sobrevivência), e baixo desliza o pomo de seu gasto sossego".
Ceará Mirim é um extremo sobrenome de cousas acontecidas. Igual ao verso de Drummond: "mas como dói"!
Sabia muito bem o historiador e poeta de Ceará Mirim que é impossível compreender a vida sem os encantamentos da alma. Daí ter deixado por um instante o fio de seu trabalho, percorrendo com o pensamento as vertentes e as doçuras do seu Éden maravilhoso. Um mundo que o elevou no mais amplo sentido da vida.
Os inspirados homens, Lúcia Helena Pereira a sobrinha querida, passam ficando. Por esta razão Nilo permanece vivo em tudo que existe de mais belo em sua terra: na igreja de Nossa Senhora da Conceição, um dos mais belos templos do Rio Grande do Norte, edificado sob a inspiração do Frei Ibiapina; o majestoso solar dos Antunes, uma edificação do século XIX, em estilo neocolonial, que atualmente abriga a sede do poder municipal; o Casarão do Engenho Guaporé, uma espécie de Olímpio dos deuses do vale a contemplar a cidade, construído nos idos de 1850 por Vicente Inácio Pereira; as ruínas de antigos engenhos, outros ainda em atividade, onde prosperou toda uma aristocracia canavieira; a velha estação do trem, restaurada pela dinâmica prefeita Ednólia Melo, marco de uma civilização podemos assim dizer; a histórica praia de Muriú, local de desembarque de franceses e portugueses, via Porto de Muriú; e porque não citar ainda as tradicionais manifestações folclóricas, como os caboclinhos, estudado e documentado por Mario de Andrade, no livro "Danças Dramáticas do Brasil", uma dança da tradição indígena, com Porta-bandeira, Matruá, Pêros e caboclos; os Congos de Guerra da comunidade de Taboão do mestre Sebastião João da Rocha, um cortejo real que rememora a passagem da rainha Ginga, soberana África pelas terras do rei Henrique Cariongo.
Este é o mundo de Nilo de Oliveira Pereira, 1909-1992, historiador, jornalista, professor e biógrafo, prêmio Machado de Assis pelo conjunto de sua obra, uma espécie de príncipe do encantador e encantado vale com suas estórias, mitos e lendas.

Autor: Severino Vicente

Historiador, pesquisador sócio efetivo do IHGRN, Coordenador da Academia de Folclore do RN
(severino_vicente@yahoo.com.br)

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